domingo, 9 de abril de 2006

T.P.M.

Ontem saí novamente para uma caminhada, sem um destino certo onde chegar, e sem os atropelos da hora marcada para retornar. Apenas sei que, quando saí, o sol projetava a minha sombra não muito alongada. Quando me aproximava, na volta à cidade, antes que eu me expusesse às luzes geradas pela eletricidade a criarem áreas iluminadas e projetarem sombras; a lua, com o fraco brilho do seu quarto crescente, projetava a minha sombra para os lados dos caminhos.
As coisas que eu via, que vi, eram as coisas que se vê quando se vai ao campo.
Tive que tomar decisões, em várias encruzilhadas. Dos caminhos que deixei de percorrer, jamais saberei o que eles me mostrariam; que emoções me provocariam. Passei por inúmeros acessos às moradias das pessoas que vivem no campo. Como não havia intenção de encontrar qualquer uma dessas pessoas, eu ia adiante. Sabe-se lá, o que resultaria de algum desses encontros.
Quem não me deixou só, foram os meus pensamentos.
Os caminhos se apresentavam com inúmeráveis e inexplicáveis curvas. Encruzilhadas, com certeza. ("Todos os caminhos levam a Roma" - lembram-se) Quaisquer daqueles caminhos, nas encruzilhadas, que eu tomasse, poderiam me levar a dar um giro ao redor do mundo, se assim o quisesse, descobrindo um mundo enorme de coisas. É o acontecer de um rizoma, tal qual a vida é, que, em cada nó, em cada encruzilhada ou escolha, nos leva a um destino certamente diferente.
Assomaram-me lembraças das últimas leituras de Deleuze, uma das mentes enigmáticas e grandiosas, capazes de decifrarem os mitos e os mistérios que somente a pura filosofia pode alcançar. E pensei, que, dos mitos e mistérios da vida, não há um sequer PhD que possa afirmar saber tudo sobre alguma coisa. Pensei que, por mais que pretendamos entender os escaninhos e mistérios da vida, é como se apenas molhássemos os pés na areia da praia, apenas umidecida pela última onda da arrebentação, do imenso oceano. A vida, é um fluir e um construir rizomático indescritível; é algo que resulta apenas de uma sucessão próxima do inexplicável que há entre a Diferença e a Repetição, das coisas e entre as coisas.
Talvez seja porque não comprendamos isso é que, às vezes, nos deixamos dominar por uma sensação de tédio. A minha história, a história de qualquer um, a História da humanidade, nada mais é do que essa enigmática sucessão de diferenças e repetições, um devir rizomático que nos constrói, para o bem ou para o mal, e que, muitas vezes, resulta apenas em escombros. Sensação essa que surge com mais freqüência em quem se afasta da aceitação de que há, sim, um Deus, uma força motora indescritível sob cuja regência o universo se cria e se recria a cada instante, tal qual na síntese de nossas próprias vidas. Talvez seja por isso, pela imensidão desse mistério, que é a vida, que já se afirmou de que Nietzche, em seu leito de morte, nos derradeiros instantes da sua existência como um dos grandes pensadores da humanidade, ele tenha apelado para que houvesse: - "Mais luz!... mais luz!". Quem sabe, esse apelo tenha sido feito por ele ter percebido, num derradeiro momento, de que não há um saber definitivo sobre o que é o universo; sobre Essa imensa força geradora do universo a partir das minúsculas partículas da matéria - suspeita-se até de uma anti-matéria -; sobre o que são essas minúsculas partículas estelares, rizomáticas, moleculares, que nos constituem como seres orgânicos, e sobre essa coisa que nos anima: a Alma, assomada sabe-se lá como, em nossas vidas, e que nos faz ser-mos, cada um per si, um ser único.
Caminhar, ontem, criou esses momentos que me fizeram passar por uma das crises maravilhosas do TPM - Tempo Para Meditar. Bendito TPM.

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