sexta-feira, 11 de agosto de 2006

Chronos, devorador de vidas e de sonhos - 8

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(parte 8)


Uma boa parte da tarde Leonor ficara de olho na estrada, ansiosa pela nossa chegada. Não conformada com a espera, dirigiu-se até a porteira. Esta estava aberta por causa dos convidados que chegavam. Os animais que ocupavam esse pasto foram transferidos para outro lugar. Assim, quando surgimos na curva da estrada, Leonor nos acenou e correu ao nosso encontro. Meu pai, diligente, parou a carroça para que eu descesse. Corri ao seu encontro. Confesso, havia sentido saudade dessa menina tão meiga, amiga dedicada. Quando nos alcançou, papai parou a carroça. Leonor – sempre ela – agradeceu e dispensou a carona. Iríamos a pé, disse ela, para aproveitarmos ao máximo o restante da tarde. Foi um reencontro feliz, alegre.
Chegamos às casas e Leonor quis mostrar-me o que estava preparado e em preparo. Havia um movimento febril, muitas pessoas desconhecidas, e todas prontas a ajudar em alguma coisa. Logo, meu pai já estava se dedicando à sua tarefa de orientar o preparo dos temperos e das carnes. Por tudo que eu via, esta, sem dúvida, seria uma das maiores festas que eu fora. Tudo girava em torno da alegria, da animação. Havia música no ar. Um trabalho inebriante. O jantar dessa sexta-feira já estava sendo preparado, quase que uma festa, e seria logo servido. Assim, os adultos teriam tempo para fazer ainda algo mais num espaço da noite.
O tempo correu célere, pois havia muita gente para conhecer, tanta coisa para ver. Leonor me acompanhava, e mostrava-me, entusiasmada, os preparativos para a festa maior. Havia tanta gente que, nós, crianças, estávamos dispensados de ajudar em algo. Grupos barulhentos de crianças se ocupavam, então, das mais variadas brincadeiras. Algumas moças também; entre elas a noiva, muito linda, simpática.
Chegado o momento do sono, cada qual se acomodava onde podia. Era como um grande acampamento, e havia uma harmoniosa descontração. Nós, as crianças, ocupamos um galpão que nos foi reservado. Como cama havia de tudo: pelegos, mantas, colchões emprestados por vizinhos, e isso contribuía para nossa felicidade: estarmos juntos. Simples felicidade.
A madrugada chegou, e com ela o retorno da faina. Quando acordamos, muitos adultos já se ocupavam das suas tarefas. Aves e outros animais eram abatidos e preparados. Havia muito trabalho, mas, acima de tudo, uma alegria quase que mística.
No ar pairava o delicioso aroma do café recém coado; o odor do leite fresco, já fervido, instigava o nosso primeiro apetite do dia. Pães eram retirados quentinhos do forno; isso se misturava aos odores dos temperos num belo convite à vida. Nem sabíamos a que horas os adultos haviam levantado para preparar essa profusão de coisas que já estavam prontas.
Terminado o café, fomos conferir as comidas que estavam sendo preparadas. Alguns homens e mulheres ajudavam meu pai no preparo das variedades de carnes que ainda seriam assadas. Logo, novamente, havia música no ar.
A um dado momento, Leonor se afastou. Quando retornou algum tempo depois, trazia um grosso volume de revistas variadas. Estas haviam sido trazidas pela família da noiva. Deu-me parte delas e pediu-me que a acompanhasse. Pelo rumo que tomamos, logo percebi para onde iríamos. Antes, porém, ela pegou dois pelegos macios, e nos encaminhamos para o seu lugar predileto, no alto da velha mangueira. Lá chegados, uma surpresa. Leonor, lembrando-se do desconforto que passara da vez em que lá estivemos havia providenciado algo com a ajuda de alguns pedaços de tábua. Ali estava a engenhosidade da minha amiga. Segundo ela, estudara com muito cuidado o que fazer e, por final, fez surgir um confortável banco. Ali ela se ajeitou, forrando-o com um dos pelegos. Antes, havia arrumado o pelego naquele que era o seu lugar preferido, onde indicou que eu me sentasse. Ali sentei-me, e o ambiente ficou admiravelmente aconchegante. Estávamos prontos para mais uma das nossas aventuras.



Um comentário:

Zana disse...

Deliciosamente apaixonante...